Transcrição:
Vamos então proceder à montagem de cordas e afinação de uma viola toeira. O nome 'toeira' tem a ver exatamente com o comprimento de corda e com a afinação. Quer dizer que ela tem um comprimento de corda de 50 [cm] para uma afinação que... devia ser de 65 [cm], como nas violas clássicas. Por isso, ela afina em 50 como uma viola de 65, logo, a corda fica muito mais bamba e muito mais... muito mais lassa, o que dá este som mais batente, mais latoso [exemplifica tocando a 5ª ordem de cordas], que é o chamado 'som toeiro', por isso é que ela tem este nome, de 'toeira'. A afinação da viola toeira, como eu disse há pouco, é... afina como as guitarras normais, as guitarras clássicas, as guitarras acústicas, do agudo para o grave mi, si, sol, ré, lá. Por vezes havia afinadores que, por causa do canto, afinavam a primeira corda em ré. As primeiras cordas, as primeiras ordens, de baixo para cima, do agudo para o grave, são em aço. Depois, a corda no meio, a terceira corda, é aço e bordão, e as outras duas, o ré e o lá, são cordas triplas, com um bordão e dois aços. Antigamente usava-se cordas de latão, porque... pronto, era a corda que havia. De qualquer modo, a corda de latão, pelas suas características e pela liga metálica, dá um som ainda mais característico, mais toeiro que as afinações modernas que... a maior parte dos tocadores usam cordas de aço, embora agora, sei que há uma fábrica lá no Norte, que é a Novagi, que já fabrica cordas propositadamente para toeira, em que as cordas suplementares, triplas, já vêm com corda numa liga de... não de latão, mas de... de bronze, pronto.
A primeira corda, então, como eu disse, afina em mi [afina a primeira ordem]. Por vezes há uma certa dificuldade em afinar este instrumento, pelas cravelhas de madeira. Se todo este sistema do cravelhal não estiver bem feito, à semelhança do que acontece nos violinos, depois torna-se difícil. A segunda corda é si [afina a segunda ordem]. A terceira corda é ré.
Sol, não é?
Sol! Mi, si, sol, exato [afina a terceira ordem]. Oitavada. Mi, si, sol... ré. Terceira corda [é a quarta!] [afina a quarta ordem]. E a quinta corda é lá [afina a quinta ordem].
[percorre as cordas para confirmar a afinação]
Havia afinadores que, por causa do canto, e por causa de terem outro desempenho no tocar, às vezes fazerem vozes e acompanhamento ao mesmo tempo, afinavam a primeira corda em ré. Só um segundo. [baixa um tom à afinação da primeira ordem e exemplifica, tocando um rasgado com uma melodia nas ordens mais agudas].
Que dá uma afinação mais aberta, não é?
Sim. Porque é uma afinação mais aberta, com a primeira corda em ré. Eu... pessoalmente, gosto mais.
Portanto, à exceção desta [quinta ordem], com essa afinação temos o acorde de sol.
Esta agora está: ré, si, sol, ré, lá. Mas habitualmente afina-se a primeira corda em mi [retifica a afinação da primeira ordem e continua a tocar]. Já estou um bocadinho destreinado, não toco isto há muito tempo! Pronto, é isto!
Qual é assim a grande diferença entre as cordas de aço e as cordas de latão? Em termos tímbricos.
Em termos tímbricos, o latão é uma liga mais macia, e dá um timbre mais toeiro, mais adocicado. Mas a viola, por si, como já tem uma tensão muito baixa, reforça um bocadinho essa zona, este... [toca um acorde] esta lassidão das cordas [exemplifica].
E as pessoas têm optado pelas cordas de aço?
Eu penso que... optou-se pelas cordas de aço porque no ressurgimento deste instrumento, na década de 1980, já não havia cordas de latão. Eu usei algumas cordas de latão, mas eu ia ali abaixo à Drogaria Neves, e eles vendiam-me arame de latão, e era a partir do arame de latão que eu fazia as cordas. Porque já não havia nada. Eles tinham um latão duro, que servia perfeitamente. Depois, com o ressurgimento deste instrumento, agora mais recente, a Novagi começou a fazer encordoamentos com as cordas em bronze, pronto, que eu acho que é interessante, e é benéfico para ajudar nas características reais do instrumento.
É mais próximo do latão?
É mais próximo do original.
Mas o latão tem mais problemas para afinar, não?
O latão é uma liga macia, percebes? Tu... há duas ligas de latão, uma muito mole e uma mais dura. Mas, mesmo assim, não é uma liga com têmpera suficiente para aguentar uma tensão forte. Na toeira aguenta, porque a tensão é baixa. Porque se fosse, por exemplo, numa viola clássica, já não aguentava. Tu esticavas, e a corda estica por si, porque não tem tensão, não tem dureza suficiente, e então estica. Porque o metal é dúctil, não é? Pronto. Funciona aqui, exatamente pelo tiro de corda ser 50 [cm], e a afinação ser... ser a que é, não é? Com o mesmo tiro de corda numa viola de clássica, ela afina na mesma altura, logo as cordas ficam mais bambas, com menos tensão.
Muito bem. E em relação às cravelhas, isto tem que ser muito bem feito, para afinar, não é?
Sim. Isto tem que ser feito à semelhança... com ferramentas como se usam para os instrumentos de arco, para os violinos, violoncelos e violas de arco, em que os buracos têm que ter um perfil cónico muito, muito ajustado, e as cravelhas têm que ter o mesmo perfil cónico, para ajustarem perfeitamente, para depois a afinação ser precisa. Como isto, geralmente, eram instrumentos feitos por violeiros que não tinham essas ferramentas, não é, porque isto eram ferramentas mais específicas de quem faz violinos e violas, faziam isto assim um bocadinho à zona e cria-se... e criam grandes dificuldades no instrumento, para a afinação. Mas... pronto, olha, é o que é, é o que havia! E o pessoal que tocava isto estava habituado assim... de qualquer modo, este sistema de cravelhas de madeira mantem a afinação mais constante. Não desafina tanto. Depois dela afinada, ela aguenta-se muito tempo. Não é como os carrilhões modernos, que a gente toca um bocado, depois tem que ajustar a afinação, este é mais estável em termos de tempo de afinação.